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Markus Lothar Fourier

De pai para pais

Atualizado: 13 de mar. de 2023

Pais, gostaria de compartilhar com vocês um pouco sobre a minha paternidade, algumas dificuldades que enfrento e também algumas ideias. Como forma de inaugurar aqui esse tema que ainda quero falar muito, é importante que o faça de um lugar humano, para que vocês me conheçam e possamos iniciar uma relação (mesmo que virtual). Não quero criar em vocês (e nem em mim) a ideia de que sou um pai perfeito só porque sou psicólogo. Na verdade, acho que ser psicólogo me traz alguns desafios extras, justamente porque volta e meia me pego com os seguintes pensamentos: "como é que eu, psicólogo, fui fazer isso?" "Imagina se as pessoas soubessem que sou assim!"


Bom, eu sou pai do Leleo (3 anos) e da Júlia (9 meses). Assim que soube que estávamos grávidos, decidi voltar à terapia com o objetivo de não repetir com meu filho coisas que vivenciei na minha própria infância. Eu deveria ter prestado mais atenção aos ensinamentos do Mestre Oogway (Kung Fu Panda): "Às vezes encontramos nosso destino no caminho que tomamos para evitá-lo." Eu tinha (e tenho) tanto medo de repetir meu passado que não consigo perceber meus filhos com clareza, não consigo escutá-los com profundidade e não consigo ter empatia. Fico perdido, sem um mapa interno e acabo recorrendo aos mapas externos: informações que dizem o que devo ou não fazer. E informação é o que não falta na nossa atualidade superconectada. O problema é que os mapas externos são criados com base em realidades genéricas, que nunca se encaixam nas nossas e que nos fazem ficar acostumados a buscar fora sempre que não sabemos como lidar com uma situação. Eu não quero aqui defender que não devemos mais ler e nos informar, acho que educação é fundamental para o exercício deste papel. Só acho que há uma hiperestimulação desse lado e um atrofiamento do outro: o da conexão relacional e emocional. E esse é um lado que nós homens geralmente somos desencorajados a experimentar e que faz falta quando os mapas externos falham e precisamos buscar dentro uma resposta.


Devagarinho (bota devagar nisso), comecei a buscar mais conexão e menos informação para lidar com meus filhos! Problema resolvido, certo? Não. Eu continuei errando bastante e isso me consumia bastante. Foi em uma conversa com minha supervisora que consegui encontrar uma saída. Eu estava falando com ela sobre um possível erro que eu havia cometido com um paciente e ela me disse a seguinte frase: "Markus, todo mundo erra, a questão é o que fazemos com esse erro, é como erramos. Erramos e fingimos que nada aconteceu, ou reconhecemos a falha, ou nos desculpamos, reparamos o que for possível e seguimos em frente?". Esse pensamento tem me acompanhado e tornando meu processo mais leve e flexível. Passei a lidar melhor com minhas falhas, mesmo quando estou de cabeça quente. Querem um exemplo? Em uma das birras mais difíceis do meu filho, no calor do momento, eu disse que, se ele acordasse sua irmã, ficaria de castigo. Ele olhou para mim e repetiu uma frase que usamos desde sempre: "aqui em casa não tem castigo, papai". Eu olhei para ele, meio desconcertado, meio envergonhado, e disse: "é verdade, não tem mesmo. Falei coisa errada. Desculpa".


Quando contei essa história na minha terapia (faço terapia em grupo), uma pessoa disse que achou linda a história, pois ele teria um modelo de pai que pede desculpas, algo que ela não teve. É com essa reflexão que quero fechar este texto. Ter ouvido isso de minha colega de grupo me fez pensar que é preferível ter um pai que erre e peça desculpas do que um pai que encobre seus erros. Porque se o filho nunca vir o pai errando, qual o ideal de ser humano ele está criando para si? Como ele se sentirá em relação ao pai quando errar? Como ele se sentirá consigo mesmo quando errar? O que ele fará quando errar? Crescer com a fantasia de que o pai é perfeito pode fazer muito mal à autoestima da criança, pois ela poderá se sentir inferior. Do outro lado, se ela tem um modelo que reconhece seus erros e que pede desculpas, que demonstra humildade, a criança, quando errar, não se sentirá diminuída. Ter começado a compreender que posso errar tirou um grande peso das minhas costas, fiquei mais leve e consegui melhorar a qualidade da nossa relação.


Ah, só um detalhe. Talvez o texto tenha dado a ideia de que, porque sei dessas coisas, eu não caio mais nas ciladas dos ideais e não me culpo mais pelos meus erros como pai. Isso não é verdade. Volta e meia me pego me "chicoteando" por algo que fiz ou disse. Os aprendizados acima me ajudam, mas não me impedem de sofrer, isso é da vida.


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